Vivemos num mundo estridente e dissonante, onde a nossa inepta orquestração, cada vez mais tumultuada, nos afasta daquilo que deveria ser mais natural em nós, e que é a aproximação com o Transcendente. Sinceramente, se há um instrumento que o demo usa eficazmente, com certeza é o barulho! Como berram na televisão, diário amigo! Como gritam nos shoppings, nos celulares, nos cinemas, nos espetáculos, nas ruas! Todo tipo de artefato imaginável é inventado para despejar decibéis diretamente nos ouvidos dos seus proprietários - artefatos que inevitavelmente vazam e atingem a todos, criando uma monumental e incessante cacofonia.
Quanto mais eu penso nisto, mais certeza tenho de que os magos vindos do oriente andaram silenciosamente, perdidos em seus pensamentos, no seu caminho sob o céu estrelado e luminoso na direção de Belém e do Grande Mistério. Todo o universo deve ter alterado a sua face, naquela noite longínqua e eternizada - e as nossas celebrações deveriam também repetir, por um momento que fosse, o nosso assombro mudo diante do Deus Feito Homem. Pelo menos em cada noite de Natal.
Imagino que o que mais agradaria ao Deus recém-nascido seria exatamente este majestoso silêncio, no qual toda a criação consciente se prostrasse diante do véu deste Perfeito Mistério - cuja perfeição e incompreensibilidade são justamente a nossa maior proteção e maior dádiva.
Assim, diário amigo, me compraz imaginar esta noite solene, plena de profundidade, na qual as galáxias giram silenciosamente em torno de uma Criança ao mesmo tempo divina e humana, o incomensurável Presente dado a toda a humanidade. Deveríamos todos ser "o quarto mago", e caminhar com os outros, mais sábios, pela mesma trilha - seguindo a estrela luminosa e calma na noite mágica. Nossos pés mal tocariam o chão, e as coisas todas do universo teriam seu verdadeiro sentido subitamente revelado e nítido: mesmo que depois esquecêssemos esta Revelação, pelo tempo e pelo espaço desta noite ela teria sido compreendida por nós, e nos transformaria para sempre. Saberíamos que o sopro divino nos sustenta, reconheceríamos quem somos, verdadeiramente - e em vez de folhas rodando num torvelinho, voltaríamos a ser como pássaros que voam segundo um propósito.
Eu preciso deste silêncio, querido diário - e eu o tenho, imenso e puro como uma abóbada de cristal.
Que todos também tenham a sua Noite Silenciosa neste Natal são os votos da sua - sempre enlevada diante do Mistério contido nele -
Rainha
Senti arrepios silenciosos com a descrição dos reis magos na noite da maior estrela
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