SED TANTUM DIC VERBUM...

...ET SANABITUR ANIMA MEA.

sábado, 21 de maio de 2011

Aechje Claesdr, segundo Rembrandt van Rijn

Querido Diário,

Imagino que muito poucas pessoas na história humana tenham tido um estudo tão perfeito sobre a sua existência terrena quanto Aechje Claesdr - retratada pelo genio de Rembrandt van Rijn. Que pintor! Que retrato! Que modelo!
Passei hoje umas duas horas ou mais olhando esta obra de genio, graças à simpatia e competência da National Gallery de Londres, que disponibiliza seus quadros com um zoom tão espetacular que podemos ver as mínimas pinceladas do grande mestre. E é mesmo algo de se ver: dias, semanas, anos, a vida inteira não seriam suficientes para esgotar a minha admiração diante de tamanha maravilha.

Aeschje era idosa quando o pincel e as tintas de Rembrandt a revelaram tão magistralmente, em 1634 - quando ele tinha vinte e oito anos e ela o inverso: oitenta e dois. E jamais a mão de um artista tocou tão delicadamente um rosto, criando um conjunto tão absolutamente perfeito: a mão do jovem pintor cria o rosto envelhecido com toda a vida  nele contida. Uma certa amargura, um certo cansaço, uma certa fragilidade:  Dame Aechje viu tudo, passou por tudo, fez o que podia e devia, e agora lá está, posando para aquele jovem pintor...  Ela não o olha, pois posar para um retrato lhe parece uma vaidade inteiramente supérflua, desnecessária, tola. àquela altura de sua vida. Ela poderia estar fazendo outra coisa e está ali, sentada, sem fazer nada. Por isto, por esta inatividade forçada para um propósito que ela sente como vagamente absurdo,  seu pensamento divaga, e ela se perde entre suas lembranças.
Mal desconfia Dame Aechje que o pincel toca cada lembrança, a recolhe e a leva para a tela, ocultando-a sob uma tênue, mas mágica, camada de cor: e por isso nós ficamos sabendo, trezentos e setenta e sete anos depois, que Dame Aechje, como todos os velhos, pensa em seus mortos. Ela não olha para o jovem Rembrandt   porque olha outros rostos, de outros tempos - e não sabe que Rembrandt  também os está retratando, enquanto retrata a ela.
Os grandes mestres da Idade Áurea da pintura flamenga foram todos excelsos, mas nenhum chegou a ser como este, o maior de todos, o mestre dos mestres! Chamam-no de "o homem que pintou a luz" - mas, mais do que isto, ele pintou almas, pensamentos, lembranças - pintou, Diário, literalmente o "impintável". Retratou o irretratável, e em cada quadro pintou outros quadros subjacentes e suprajacentes. À medida em que olhamos, outras realidades aparecem, frutos do mesmo gênio nunca antes nem depois igualado na arte da pintura. Estão todas ali, na tela, essas  realidades transparentes sobrepostas.

Uma bela tarde esta, querido Diário! Fiquei pensando no genio humano e  comparando suas expressões com os patéticos exemplos da modernidade... Mas isto fica para outra página: NESTA, que a pura beleza criada por um mestre imortal brilhe sozinha e luminosa, e que Rembrandt Harmenszoon van Rijn e sua arte perfeita sejam para sempre celebrados entre os homens.
Sua deslumbrada,
Rainha
PS: o link para Dame Aechje e o inigualável talento de Rembrandt:
http://www.nationalgallery.org.uk/server.php?change=ZoomTool&contentType=ConMediaFile&contentId=5897&z=1&x=189&y=0

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